Nessa madrugada de terça pra quarta (23), aconteceu a final da Liga dos Campeões da CONCACAF, principal competição de clubes da América Central, e o resultado foi, diriam alguns, previsível. O UANL (mais conhecido como Tigres) derrotou o Los Angeles FC de virada, por 2x1, e sagrou-se campeão inédito. A derrota dos americanos fez a escrita negativa da Major League Soccer na Concachampions se seguir, passando longe da taça desde o longínquo ano 2000. Foi pensando nisso que me acendeu uma questão...
A MLS nasceu em 1995, sendo o grande legado esportivo da Copa do Mundo que haviam sediado no ano anterior. Para ter mais que um catado na disputa em 94, eles precisaram formar um grupo de jogadores, e após o mundial, precisavam alocar-los em algum lugar, e nada mais justo que criar uma liga profissional para isso. Os primeiros anos da liga são motivos de piada para os mais acostumados com o esporte, pelas regras estranhas, criadas pra chamar a atenção do público local, mas eles criaram um resultado interessante no futuro.
Em 1997, dois anos depois da criação da liga, o Los Angeles Galaxy foi finalista da Concachampions, perdendo na final para o tradicional Cruz Azul, do México, por 5x3 (quatro anos depois, esse mesmo Cruz Azul trouxe muito trabalho para o Boca Juniors em território sul-americano, na Libertadores de 2001). No ano seguinte, o D.C. United sagrou-se campeão, vencendo o Toluca, também do México, por 1x0 (e vencendo o Vasco, de Romário, na extinta Copa Interamericana). E em 2000, o Los Angeles Galaxy não perdeu a outra chance que teve, e conquistou pra si a taça, ganhando dessa vez dos hondurenhos do CD Olímpia, por 3x2. Em quatro anos, três finais e dois títulos, um belo retrospecto para uma liga recém-nascida.
Em 2002, a geração moldada e maturada pela MLS foi até o Japão/Coréia do Sul para disputar a Copa do Mundo, e fizeram um papel muito digno, ganhando de Portugal na estreia, por 3x2, e alcançando as quartas de final, onde, com uma mãozinha amiga do juiz Hugh Dallas (e de Torsten Frings), impediu que o escrete estadunidense fosse mais longe. Ótimas campanhas continentais com os clubes, e uma boa Copa com a seleção, permitiu aos ianques sonharem, até o novo Pelé surgiu por aquelas bandas, porém o futuro não foi tão bonito.
Mesmo com a chegada do astro David Beckham ao Los Angeles Galaxy em 2007, e por consequência, a lei do jogador designado, que faria com que cada time da liga pudesse sonhar em ter seu próprio Beckham ("El Diablo" Etcheverry já não era bom o suficiente?), a MLS só foi sentir o cheiro da taça da Concachampions em 2011, quando o Real Salt Lake chegou até a decisão, onde enfrentou, e perdeu, um Monterrey que entraria pra história. Se com os americanos não deu certo, vamos com os canadenses! Montreal Impact e Toronto FC habilitaram-se para a tarefa, mas sucumbiram diante do Club América e Chivas Guadalajara, dois gigantes mexicanos. Parece maldição.
Na seleção nacional, os frutos foram um poucos melhores, mas nada muito considerável. Fizeram uma Copa do Mundo terrível em 2006, tirando pontos curiosamente só da campeã Itália. Em 2009, na Copa das Confederações, ficaram a 45 minutos de derrotar o Brasil, mas tomaram a virada. Nas duas Copas do Mundo seguinte, tiveram força apenas para chegar entre os 16, e sucumbir no tempo extra. E acho que não precisamos comentar do ciclo vexaminoso até a Rússia...
Analisando esses 25 anos da MLS, já é bem possível dar um palpite claro do porque dessa queda de rendimento, mas preferi antes procurar exemplos semelhantes na outra parte do mundo em que a religião do futebol demorou um pouco mais a chegar: a Ásia, mais especificamente, Japão, China e Austrália (eu sei, eu sei, não é Ásia geograficamente, mas estamos falando de futebol).
A J-League nasceu em 1992, e nela entraram diversos times que já existiam, não-profissionais, frutos de empresas locais, como o Urawa Red Diamonds (Mitsubishi) e Kashiwa Reysol (Hitachi). Porém foi o Kashima Antlers que deu o principal passo para a popularização da liga, trazendo Zico para jogar no país. A Chinese Super League se formou de maneira bastante semelhante, com times vindo de empresas locais, e sendo estabilizadas e popularizadas pelo talento do jogador brasileiro, dessa vez, um nome menos pomposo, pois quem não tem Zico, vai de Muriqui.
Já a formação da A-League foi um pouco diferente. Os times eram formados baseados nos grupos de imigrantes que haviam no país, como sérvios, croatas, entre outros. Como já existia uma tensão natural entre estes grupos, a violência tendia a ir para os estádios. Os talentos saiam cedo do país, rumo principalmente a Inglaterra, onde começaram a se desenvolver, formando no fim dos anos 90, início dos anos 2000, o que seria a geração de ouro do país. Ai entra a criação da liga, que praticamente ignora o antigo background das equipes (apenas três times da antiga NSL sobreviveram a transição).
Das três experiências asiáticas, a japonesa foi a mais bem sucedida, elevando o nível tanto do futebol ao nível de clubes, alcançando 11 finais, e sete títulos da Liga dos Campeões da Ásia; quanto na seleção, que desde seu debute em 1998, alcançou três fases de mata-mata, e foi a todas as Copas subsequentes. A China, após a criação da CSL, chegou em duas finais da ACL, e ganhou ambas, sendo representado pelo Guangzhou Evergrande, apoiado principalmente no talento estrangeiro, o que afetou a seleção nacional, que não alcançou nenhuma Copa do Mundo desde o surgimento da Liga, e agora, conta com a naturalização de atletas estrangeiros como principal esperança para o futuro. A Austrália possui uma participação parecida com a China a nível de clubes, tendo duas finais de ACL, e um título, com o Western Sydney Wanderers, em 2014. A seleção depois de 2006 jamais ficou fora de uma Copa, porém não passou da fase de grupos em nenhuma das edições subsequentes, com times cada vez mais envelhecidos. A quantidade de jogadores locais na Premier League atingiram os menores valores em anos, e não parece haver nenhum espectro de mudança em relação a isso.
Visto os quatro casos de criação de ligas do texto (EUA, Japão, China e Austrália), por que o do Japão pode ser considerado o mais bem sucedido? Pois ele respeitou dois fatores importantes para a cultura futebolística: o background e o jogador local. Não relegou os antigos clubes a irrelevância, apesar de trazer o talento estrangeiro, não deixou os talentos locais em segundo plano. Os estadunidenses e chineses respeitaram o background, mas não os jogadores, o que forçou eles a criarem alternativas para preencherem suas seleções (a principal delas sendo a naturalização e a busca de filhos de locais ao redor do mundo). A Austrália não respeitou ambos, e lentamente isso vai cobrando seu preço, com a queda de qualidade cada vez mais vertiginosa do talento local.
O futebol não é uma receita de bolo, não existem repostas exatas do que dá certo ou do que dá errado. Porém, para adquirir tradição, é necessário tempo, e respeito, tanto dos adversários perante você, quanto de você para o seu próprio futebol.
Submitted December 23, 2020 at 01:23AM by marco_gaviao https://www.reddit.com/r/futebol/comments/kiol2s/texto_longo_e_chato_sobre_futebol_alternativo/?utm_source=ifttt
No comments:
Post a Comment