Ambos os Guilhermes jogavam bola no "Alpha Society" (antigo Elano Center), uma escolinha de futebol que existia na divisa de São Bernardo e Santo André, no ABC paulista. Treinei futebol lá entre 2005 e 2011, convivendo com eles.
Obviamente, dado que o menino é pai do homem, eles eram os que mais se destacavam. Eu tive mais contato com o Mantuan, que era da mesma turma que eu. Os pais dele eram super rígidos, sobretudo a mãe. Ao que me parece, viam os dois garotos (Gustavo, o mais jovem, era de uma categoria abaixo) como uma espécie de investimento em renda variável. Então, sempre estavam lá, analisando se os dividendos seriam pagos em breve ou não.
Em um desses amistosos entre as escolinhas da região, nosso time perdeu. E, qualquer um poderia apontar, a culpa foi minha: zagueiro grosso, fiz um gol contra e uma falta que geraria outro tento do adversário. O Mantuan fez dois gols naquele dia, mas perdemos por 3x2.
Fiquei muito magoado pela minha incompetência, mas meus pais, zelosos, confortaram-me. "Segue o jogo. Acontece". No meio de abraços e beijos, o Mantuan passou correndo, chorando. Uma tia, provavelmente que chegara atrasada para o jogo, assustou-se: "Que foi, Gui?". "É que ele não aguenta ouvir umas verdades", resumiu a mãe.
Como os Corinthianos devem lembrar, o Mantuan cometeu uns erros feios no time, como aquela bola perdida quando ele era o último homem. Chorou nesse dia. De maneira perturbadoramente semelhante às lágrimas daquele amistosinho. O menino é pai do homem, mas, dessa vez, mais relevante parece ser que a mãe era progenitora tanto de um quanto de outro.
A família do Arana era engraçada, não parecia rígida igual ao do Mantuan. A pessoa que mais se destacava era a avó dele, uma mulher corpuda, sempre descabelada e com cara de irritada. Domingo de manhã, ainda nos amistosinhos, a maioria dos pais deveria ficar feliz em ver os filhos de exercitando... Essa mulher, no entanto, não. Ela estava em um nível totalmente diferente de comprometimento. Gritava, toda hora, sempre estridente, o nome do neto."
"Ô, Araaaana, corre lá, Araaaana".
Eventualmente, xingava forte os juízes e os técnicos, sobretudo se estes tiravam o neto, independente do contexto. Chegou ao ponto dela ser "expulsa" do amistosinho por quebrar uma cadeira.
Não sei se ela está viva hoje, mas, se estiver, certamente consigo identificar a velhinha esgarçada gritando no Mineirão. Inconfundível. "Araaaana"
Eu não virei jogador. Esses caras tem muito mais sucesso do que eu. Mas acho que me regojizo da compreensão dos meus pais no Domingo de manhã. Não fui um investimento, nem motivei ataques de fúrias da minha avó. Acho que ficou no zero à zero.
Araaana.
Submitted March 26, 2022 at 10:34PM by Brudsau https://www.reddit.com/r/futebol/comments/tpblo4/treinei_com_o_guilherme_mantuan_e_com_o_guilherme/?utm_source=ifttt
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